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terça-feira, 2 de maio de 2017

Usos, costumes e nenhum crescimento

Corrupção é um problema central para entender o mau desempenho econômico do Brasil, mas não da maneira como geralmente aparece no discurso popular. Não é raro receber e-mails ou perguntas no blog sobre o impacto fiscal da roubalheira generalizada que tem assolado o país e, como regra, os interlocutores saem desapontados com as respostas.

A pilhagem associada às atividades investigadas pela Lava Jato, por exemplo, é estimada na casa de R$ 43 bilhões, grana para lá de razoável, mas empalidece face ao montante do gasto público do governo federal em 2017: R$ 1,3 trilhão. Ao longo de muitos anos roubou-se pouco mais de 3% do que o governo federal gastará apenas este ano.

É uma ilusão, portanto, achar que o combate à corrupção resolverá a questão do gasto público, mas isto não o torna menos importante. A corrupção tem um efeito corrosivo na capacidade de crescimento do país e está profundamente ligada à enorme presença do estado na economia.

Há essencialmente duas formas de ganhar dinheiro: uma, virtuosa, envolve a atividade inovadora. Novos produtos, novos processos, novos mercados geram enormes lucros para empreendedores e ao mesmo tempo modificam o entorno econômico e social de maneira radical. No processo a produtividade aumenta e, com ela, o padrão de vida da população: entre 1820 e 2010, por exemplo, estima-se que a renda per capita global aumentou 11 vezes, de US$ 712 para US$ 7.814 (a preços de 1990). O aumento de produtividade explica a maior parte deste fenômeno.

A alternativa envolve tomar dinheiro alheio, nem sempre por meios ilegais. Monopólios (ou oligopólios) criados artificialmente; barreiras à competição, seja local, seja internacional; subsídios, explícitos ou não, são algumas das práticas que permitem a segmentos politicamente conectados também remodelarem o entorno econômico para capturar esta renda, sem, contudo, produzir a aceleração da produtividade que permite o aumento persistente do bem-estar.

A corrupção está intimamente entrelaçada às atividades acima descritas. O acesso a elas tipicamente passa pelo poder público e, portanto, quem quiser este acesso terá que pagar a quem estiver no controle do aparato governamental naquele momento (ou com perspectivas de tomar o controle deste aparato mais à frente).

Também não é preciso muito para concluir que países em que o setor público interfere de maneira mais frequente e intensa no domínio econômico oferecem mais oportunidades para ganhos ligados a práticas de captura da renda da sociedade e, portanto, mais corrupção.

Assim, quanto mais discricionária for a política econômica, privilegiando alguns setores sobre os demais, tanto maior será a roubalheira. O efeito colateral desse arranjo é o crescimento medíocre da produtividade e, portanto, do bem-estar. Ao contrário do que proclamou Eugênio de Aragão, ex-ministro da Justiça (ainda bem!), corrupção não é “graxa na engrenagem da máquina”; é só areia!


Caixa 2 e presentes fazem certamente parte dos nossos “usos e costumes”. Nem por isto, porém, devem ser tolerados, pois se encontram na raiz do baixo crescimento. Reclamar do câmbio e pedir anistia à corrupção pode ajudar os que vicejam neste arranjo perverso, mas, com certeza, não há de nos colocar na rota do crescimento acelerado.




(Publicado 26/Abr/2017)

25 comentários:

"Muitas vezes é melhor pagar a propina e não fazer a obra.
Sai mais barato para o contribuinte."
MÁRIO HENRIQUE SIMONSEN

Alex, não sabemos mensurar o tamanho da corrupcao. Até porque quando ela é bem-sucedida, nada aparece. Grande parte da populacao acredita que ela pode ser bem maior e, por isso, vê nela a causa dos nossos problemas fiscais.

Não sei se a corrupção afeta negativamente o crescimento do país. A política paulista historicamente foi muito corrupta com o "rouba mas faz" do Ademar, ou coisa parecida do Quércia e do Maluf, com o estado sendo mesmo assim a locomotiva do Brasil. Mas a qualidade do crescimento e seu efeito sobre o grosso da população são afetados negativamente.

Corrupção sempre é graxa onde impera o Estado Mamute; graxa exagerada atrapalha o funcionamento do motor. Vão calibrar o lubrificante apenas.

Nossa, como vc eh burro!

Soh podia ser economista ortodoxo, mesmo!

A nostalgia mítica dos tempos em que havia moral esconde a essência da sociedade burguesa, capitalista portanto, desde os primórdios: o domínio e hegemonia da burguesia,exercem-se através do cinismo, da hipocrisia, da falsidade, da traição, do segredo, da mentira, da corrupção: as apólices de seguro da propriedade.

Os “pais fundadores” saídos da primeira revolução burguesa em nome do povo, a revolução americana, sabiam que a corrupção estava no âmago da sociedade nova que nascia. A lei que aboliu a escravatura nos EUA, um dos passos fundamentais para o progresso da humanidade, foi conseguida por Abraham Lincoln corrompendo activamente dezenas de congressistas para conseguir os votos necessários.

O combate à corrupção - legiferação, justiça, polícias, serviços de informações, transparência, monitorização, regulação (oh! a regulação!) etc. – é, também ele, um instrumento ao serviço da corrupção sistémica do capitalismo, uma espécie do velho “agarra que é ladrão”.

A corrupção, na época do imperialismo e do neoliberalismo já não é mais o lubrificante da democracia, como justamente dizia o nosso Espinoza duas décadas atrás.

É agora a democracia, adulterada completamente pela subordinação ao funcionamento do mercado financeiro, que passou a ser o lubrificante da corrupção, factor estruturante da actual sociedade burguesa.

Sem o lubrificante da corrupção o sistema democrático burguês emperra; sem democracia, a corrupção apareceria com a sua verdadeira face de facilitadora por excelência do saque organizado a favor dos “donos disto tudo” e não apenas como uma lamentável falha do sistema.

"Sem o lubrificante da corrupção o sistema democrático burguês emperra; sem democracia, a corrupção apareceria com a sua verdadeira face de facilitadora por excelência do saque organizado a favor dos “donos disto tudo” e não apenas como uma lamentável falha do sistema."

Deve ser por este motivo que Nigéria, Argentina, Rússia, Venezuela, Guatemala e outros que tais são campeões de crescimento e bem-estar, enquanto Dinamarca, Noruega, Alemanha são uns fudidos...

Sério: como você faz para teclar com ferraduras?

Não há como negar que o choque recessivo provocado pela redução do investimento público é um dos determinantes da crise atual.

http://brasildebate.com.br/wp-content/uploads/NotaCecon1_Choque-recessivo-2.pdf

"Não há como negar que o choque recessivo provocado pela redução do investimento público é um dos determinantes da crise atual."

Não? Investimento federal caiu R$ 28 bi de 2014 para cá (a preços constantes); PIB caiu R$ 511 bi. Acredita que o multiplicador do investimento seja 18,3?

A propósito a despesa federal no período cresceu R$ 9,2 bi...

Prezado Alex

Ao lado dessas suas lúcidas reflexões, penso que deveriam ser também consideradas as prioridades e propriedades dos gastos públicos. Desde a construção de Brasília, passando pelo Brasil Grande, domínio do Ciclo da Energia Nuclear (NUCLEP, NUCLEN, ANGRAS...), Projeto Jari, ITAIPU (sistema de corrente contínua), ferrovias e rodovias mal-projetadas, a epopeia Tucuruí e o desmatamento da área de seu reservatório... Dando um salto, nos "tempos atuais" obras não menos biszarras, "cidades administrativas", "arenas" para a Copa, Olimpíadas. E o extremo da insensatez (fazendo jus à inclusão na obra de Bárbara Tuchman), o tal Porto Maravilha e seus VLTs. Agora, se você quer mesmo algo que nem no inferno seria idealizado, leia sobre a babilônica Cidade das Águas, na cidade de Frutal, nos confins de Minas, onde morei nos anos 70. Lá, até hoje, não se dispõe de um único leito de UTI. Não é preciso dizer que lá também não tem rio (pelo menos, até o momento)! E... la nave va.
Abs.

O senhor afirmou:

“países em que o setor público interfere de maneira mais frequente e intensa no domínio econômico oferecem mais oportunidades para ganhos ligados a práticas de captura da renda da sociedade e, portanto, mais corrupção.”

Os dados mostram que na Noruega há forte presença do Estado em praticamente todos os campos da economia. O Estado tem 44% das ações da Norsk Hydro, tem participação de 37% na Bolsa de Valores de Oslo e em dezenas de empresas. O Estado também controla a petroleira Statoil, o grupo de telecomunicações Telenor, a fabricante de fertilizantes Yara, e o maior banco do país, o DnBNor.

De acordo com a sua teoria a Noruega deveria ser um dos países mais corrupto do planeta. Mas os dados mostram que este não é o caso e, portanto, não há necessariamente uma relação causa-efeito entre presença do Estado e o nível corrupção.

Na prática a teoria é outra?

"Teclar com ferraduras" foi ótimo. Kkkkkkkkk

"De acordo com a sua teoria a Noruega deveria ser um dos países mais corrupto do planeta. Mas os dados mostram que este não é o caso e, portanto, não há necessariamente uma relação causa-efeito entre presença do Estado e o nível corrupção."

Confundir o fundo soberano da Noruega, isolado de políticos, com o governo do país é realmente um feito. Parabéns, seu tratador vai informar qual é o seu prêmio...

Alex, é errado falar que a elasticidade renda das importações no Brasil é alta pq o Brasil é um país muito fechado?

Infelizmente Dom João chegou com sua Coroa quebrada, desapropriando quem havia trabalhado e produzido no Brasil, vendeu títulos e favores para manter uma vida abastada e depois voltou à Portugal tendo roubado todo tesouro e dinheiro que havia nestas terras. Pediu ao filho para fazer a independência para que a família permanecesse sugando o país. Enfim, nada mudou em 200 anos.

O custo da corrupção realmente é muito mais alto, afinal, não foi computado os benefícios de completar uma obra no prazo. Se a transposição do Velho Chico tivesse ocorrido no prazo, quanto o Nordeste teria economizado em caminhões pipa, e quanta agricultura teriam produzido? Se a ferrovias tivessem sido construídas dentro do cronograma, quanto teríamos reduzido os custos de logística? Agora vamos calcular isso ao longo de 200, ou mesmo 50 anos.

Chegamos à uma encruzilhada, ou punimos todos bandidos, independentemente de partido, ou seremos para sempre o gigante tupiniquim.

Alex, geralmente estas analises utilizam a participacao dos gastos do governo na economia como variavel representativa da presenca do Estado. Nao acha que os nordicos de forma geral representam um desafio para o que voce propoe no texto?

Alem disso, eu te desafio a mostrar evidencia de que menos governo é melhor do que mais governo para o crescimento economico. Se assim fosse, tao claro como voce coloca, nao haveria tanto debate e controversia sobre o tema.

Se menos governo for equacionado com menos burrocracia, menos corrupção na fiscalização, menos alvarás e impostos para todas as coisas, obviamente menos governo geraria maiores incentivos a produção e inovação.

Mas inovacao necessariamente implica em externalidades e poder de monopolio. Os setores mais inovadores sao tipicamente marcados por preco maior que custo marginal, e portanto, adotando a ideia de rent-seeking (a la A.Krueger) que vc parece adotar, sempre se beneficiarao dessa renda. De fato, os economistas que levaram a serio a questao da inovacao e mudanca tecnica (Paul Romer, por exemplo) consideram a padrao a situacao em que que prevalecem competicao imperfeita e rent-seeking (as chamadas rendas schumpetrianas - sim, existem diferentes tipos de rent-seeking). Pautado nisso, e nas discussoes sobre aprendizado e spillovers de conhecimento, muitos economistas defendem intervencao estatal na forma de protecionismo e subsidios. De uma olhada no ultimo livro do Stiglitz, "Creating a Learning Society", vc precisa se atualizar. Abracos

Muito curioso esse artigo! Sem respaldo dos fatos, aliás, bem típico.

1 - de 1930 a 1980 o Brasil foi um dos (senão o) países que mais cresceu no mundo e contou com brutal interferência estatal

2 - Na China o câmbio é desvalorizado artificialmente e tem crescido mais que qualquer outro no globo, muito via produtividade também

3 - Aliás, quer exemplo melhor de intervenção no meio econômico por parte de políticos que a China?

4 - O Japão na sua reconstrução contou com interferência pesadíssima do Estado e assim construiu o seu milagre

5 - Quase 40% da renda dos nórdicos passam pelo govt... e ainda que o nobre exBCB queira dizer que um fundo SOBERANO é dissociado do povo (e seus presentantes), ele atualmente conta mais com saques que com e seus depósitos giram em torno dos 8% do PIB, ou seja, mesmo excluindo o fundo teríamos uma carga tributária parecida com a brasileira

6 - Isentonas mesmo só as decisões do CARF. O resto é tudo pra defender meia entrada dos amigos

"1 - de 1930 a 1980 o Brasil foi um dos (senão o) países que mais cresceu no mundo e contou com brutal interferência estatal"

E o crescimento não teve nada a ver com a urbanização, eu presumo. Crescemos apesar da interferência estatal; não por conta dela. Tanto que de 1980 para frente, quando a urbanização acabou, o crescimento foi junto...

"2 - Na China o câmbio é desvalorizado artificialmente e tem crescido mais que qualquer outro no globo, muito via produtividade também

3 - Aliás, quer exemplo melhor de intervenção no meio econômico por parte de políticos que a China?"

E aí também , imagino, a urbanização não desempenhou nenhum papel. Aliás, uma das apostas do Acemoglu é que a China vai encontrar suas barreiras também.

O quê? Não leu o Acemoglu? Para mim não é surpresa alguma...

1 - de 1930 a 1980 o Brasil foi um dos (senão o) países que mais cresceu no mundo e contou com brutal interferência estatal

Explique, então, a Argentina.

O Acemoglu defende em um de seus papers que paises mais afastados da fronteira tecnologica devem impor limites a livre competicao e promover subsidios a industria

Acemoglu, Aghion, Zilibotti (2006)

https://economics.mit.edu/files/4472




2- Na China, até 2014 havia um esforço do governo chinês para que sua moeda não valorizasse além do que eles queriam. De 95 a 2014, o câmbio hora ficou estável, hora valorizou. De 2014 em diante, o câmbio desvalorizou. E o que eles fizeram? Curiosamente, começaram a vender as reservas para conter a desvalorização.

Comentário sensacional e esclarecedor, Alex, que reforça, ao fim e ao cabo, minhas convicções liberais.

Além disso, o comentário esboça um mapa do caminho (road map) para o crescimento econômico.

1- de 1030 a 1980
e não houve nenhuma guerra pra atrapalhar o crescimento do resto do mundo nesse érído

Excelente artigo, vou compartilhar no meu perfil do facebook!



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