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quarta-feira, 15 de abril de 2015

De pesos e medidas

Na semana passada fui convidado a debater a tese do governo, que atribui o mau desempenho da economia brasileira à desaceleração global. Obviamente discordo deste diagnóstico e os 18 leitores já foram submetidos mais de uma vez ao tema. Podem, porém, ficar aliviados, porque não pretendo tratar do assunto mais uma vez.

A discussão, contudo, me fez pensar acerca dos argumentos que são normalmente utilizados pelo governo e seus partidários, em particular o pouco respeito que costumam reservar à coerência e consistência interna. Parece um pouco abstrato, mas, se me derem um tanto de crédito, acredito que a questão se elucida em um parágrafo ou dois.

Tome-se, por exemplo, a tese da desaceleração doméstica versus o crescimento mundial. Independentemente de sabermos se houve, ou não, menor expansão global que possa explicar nosso fraco desempenho recente (não houve, caso queiram saber), será que os proponentes da tese estariam dispostos a defendê-la em circunstâncias distintas?

Em particular, governo e partidários admitiriam que o crescimento observado no período 2003-2010 resultaria do impulso global, ou insistiriam que decorreu da liderança inspirada do presidente Lula durante seu governo? A pergunta é retórica, claro, pois já sabemos que a resposta é a segunda alternativa.

Isto dito, se creem que o crescimento do país lá atrás resultou de seus acertos, como seria agora possível argumentar que a desaceleração vem de fora, e não dos erros de política econômica? Eu ganho, nós empatamos e vocês perdem?

Também na questão inflacionária a assimetria impera. Assim, hoje o BC atribui a aceleração e a persistência da inflação à “mudança de preços relativos”, apelido do aumento de preços administrados e da desvalorização da moeda. Todavia, quando a variação de preços administrados caiu a 3,6% (em 2012) e 1,5% (em 2013), o BC não veio a público externar sua preocupação com uma inflação ainda na casa dos 6% ao ano, apesar da ajuda extraordinária dos preços administrados. Pelo contrário, comemorou que a variação do IPCA não havia ultrapassado o limite de 6,5%.

Diga-se, aliás, que a assimetria de análise do BC não se limita ao comportamento dos preços administrados. Ao dólar mais caro se atribui a inflação mais elevada, mas, ao mesmo tempo, o BC sugere que, no futuro, o repasse do dólar para a inflação será menor. Portanto, para o BC o dólar caro é causa da inflação passada, mas, de alguma forma, não fará rodar os moinhos da inflação futura...


Dado que a inflação do primeiro trimestre deste ano deve ficar em torno de 1,3% ao mês (algo como 17% ao ano!), procuro fervorosamente artigos de Nakano que demonstrem alguma apreensão com o ritmo de aumento de preços, da mesma forma que argumentava que a inflação anualizada dos três meses terminados em julho de 2014 já estava abaixo da meta. Não se preocupem, porém, pois não cheguei (nem chegarei) a perder o sono por não ter encontrado nenhuma palavra dele a este respeito.

A isto se somam todos os que defenderam incondicionalmente a política econômica em vigor nos últimos anos e que agora posam de críticos ferozes, numa tentativa desajeitada de se distanciar do fracasso.


Não haveria, num mundo ideal, condições para estas instâncias de desonestidade intelectual. Como não é nele que vivemos, porém, resta apontar as incoerências e as inconsistências, na vã esperança que, da próxima vez, ao menos passem a pensar com mais cuidado nas consequências lógicas das suas próprias “análises”.




(Publicado 8/Abr/2016)

18 comentários:

Tá ressentido com os "Economistas" da Unicamp? Sai dessa vida, cara!

Ressentido? De forma alguma; sou muito grato a quem me diverte...

Essa turma não discursa para os que tem conhecimento e pensam, pois os argumentos e a lógica nunca fazem sentido. Eles falam para a galera menos instruída, galera esta que agora sofre com os horrores da politica econômica (e roubalheira escancarada)!

O senhor tem inveja do Mantega ?

Tenho: eu queria ser burro e feio, mas não consigo.

16 de abril de 2015 00:02 Excluir

Penso que nosso desafio como economistas e instrutores está em tentar encontrar "alguma luz" no final do túnel, principalmente aos empresários e empreendedores que nos ouvem.

O senhor esqueceu de avisar para o Mantega que a contabilidade criativa era crime?

Não, mas esqueci de avisar que imbecis não podem comentar neste blog...

Excelente artigo. Se eles tivessem a humildade de recolhecerem os erros que estavam comentendo, não estariamos com uma inflação estourando a meta. E tudo passa como se nada estivesse ocorrido, como se tivessem o direito a tudo. Triste Brasil.

Não se preocupe, a escola unicamp de pensamento econômico já provou que desvalorização da moeda é algo ótimo pra economia

https://jlcoreiro.wordpress.com/2015/01/25/a-hora-e-a-vez-dos-controles-de-capitais/



O timing do Orelho foi impecável, como sempre...

Eu estou ressentido com a Economia da Unicamp, pois paguei para fazer uma especialização e ouvi muita besteira por lá.
Mas me espanta que estejam falando contra! Normalmente eles dão explicacões fantásticas de pq, mais uma vez, sua teoria não funcionou na prática... Chega a ser hilário
O que sumiu foram os intelectuais que leem Carta Capital dizendo como foi estratégico o porto em Cuba... CPI do BNDES já!

Carlos Emerson says: 16 de abril de 2015 05:53 Reply

"Penso que nosso desafio como economistas e instrutores está em tentar encontrar "alguma luz" no final do túnel, principalmente aos empresários e empreendedores que nos ouvem".

Devido a este guverno, economistas estão completamente desmoralizados.

Qualquer empresário no país sabe que a luz no fim do túnel é o trem na contramão

Por gentileza, o senhor toparia trocar a foto sua com a camisa do SPFC para uma camisa com a frase Menos Marx Mais Mises,para ajudar o movimento liberal?

Veja que o movimento liberal no Brasil cresce,ate tem uma reportagem falando do Mises como o novo teórico da direita!!

http://jconline.ne10.uol.com.br/canal/economia/nacional/noticia/2015/04/17/mises-o-teorico-da-nova-direita-redescoberto-nas-manifestacoes-177137.php

Opa!!! Colocar todos os economistas brasileiros no mesmo saco não é correto!
Diversos previram a merda que a política quermesseira da aluna da Unicamp daria, inclusive o dono deste blog!
A luz no fim do túnel é nossa conhecida!
Politica fiscal responsável!
BC independente e meta de inflacao levada a serio!
Investimento público em infraestrutura
Melhora da eficiência do estado, de preferência com sua redução não em setores básicos!
Esqueci alguma coisa? Tem algo novo nesta receita?

Eu participei da conferência do EPL e a conclusão foi óbvia:Foi o FED que pirou essa crise injetando trilhões de dólares!!

http://veja.abril.com.br/blog/rodrigo-constantino/crise-internacional/a-crise-de-2008-foi-mesmo-culpa-do-livre-mercado/

Ao ver as previsões desses "economistas" para 2014, fico pensando: como essa gente ainda tem coragem de sair de casa?