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quarta-feira, 15 de outubro de 2014

Paradoxos heterodoxos

A economia não cresce; apesar disto o desemprego tem caído, atingindo 5% em agosto nas seis regiões metropolitanas pesquisadas pelo IBGE, que correspondem a pouco mais de um quinto do emprego no país. Trata-se do menor registro para o mês desde que estas estatísticas começaram a ser coletadas, o que, aliás, tem sido verdade em todos os meses deste ano. Em que pesem questões específicas destas regiões, o resultado desafia o senso comum: como é possível a redução do desemprego em face da economia estagnada?

O resultado se torna menos paradoxal quando examinamos o número mais de perto. Nessas regiões o emprego não cresceu; muito pelo contrário, caiu nos oito meses deste ano, registrando em agosto redução de 85 mil postos de trabalho na comparação com o mesmo mês do ano passado. Este comportamento é consistente com o que seria natural no caso de uma economia cujo crescimento deve ficar ao redor de zero.

Fica claro, portanto, que a evolução positiva do desemprego em 2014 não se deve ao desempenho favorável do emprego, mas sim a desenvolvimentos que afetam a oferta de trabalhadores.

Parte da história reflete a demografia. Há 10 anos a população em idade ativa (PIA) crescia perto de 2% ao ano; hoje o crescimento oscila de 1% a 1,5% ao ano. Isto, porém, não explica o aparente paradoxo: mesmo este ritmo mais modesto de crescimento da PIA supera por larga margem a expansão (negativa!) do emprego. Com mais pessoas chegando ao mercado de trabalho do que empregos sendo gerados, o natural seria observarmos desemprego crescente.

O que tem ocorrido, porém, é uma redução persistente da fração da PIA engajada no mercado de trabalho (a população economicamente ativa, PEA, ou força de trabalho), seja trabalhando, seja na busca por empregos. Entre 2003 e 2013 a PEA foi equivalente em média a 57% da PIA, proporção que hoje se reduziu para pouco menos de 56%.

Parece uma queda pequena, mas não é. Caso a PEA em agosto deste ano atingisse a mesma proporção registrada um ano antes, o total de pessoas engajadas no mercado de trabalho seria algo da ordem de 24,8 milhões; na prática, porém, apenas 24,3 milhões de pessoas participavam dele, uma diferença de quase 500 mil pessoas.

Vista por outra ótica, entre agosto de 2013 e agosto de 2014 a força de trabalho encolheu em 160 mil pessoas, quase o dobro da queda do emprego no período. É este desenvolvimento que explica a redução do desemprego apesar da produção e do emprego estagnados.

Não é claro o que causou este fenômeno. Ele parece mais pronunciado na faixa etária de 18 a 24 anos e pode resultar tanto da busca por maior qualificação por parte dos jovens (que teriam se afastado do mercado para estudar), como do aumento da “geração nem-nem” (nem trabalha, nem estuda). Muita gente boa tem queimado as pestanas para entender o que ocorre.

Embora o debate sobre as origens do fenômeno seja de interesse por si só, prefiro destacar aqui uma conclusão que me parece pouco notada. Se há menos gente disposta a trabalhar (por bons ou maus motivos), nossa própria capacidade produtiva deve ser menor do que imaginávamos.

Em números, com a produtividade crescendo ao redor de 0,7% ao ano, enquanto a força de trabalho encolhe em magnitude parecida, nossa capacidade atual de crescimento não deve ser muito diferente de zero. Isto, contudo, não deve ser persistente, já que em algum momento a força de trabalho voltará a crescer em linha com a população.


Ainda assim, este desenvolvimento parece explicar a resistência da inflação mesmo em face do baixíssimo crescimento deste ano, o que ajuda a esclarecer mais uma aparente anormalidade brasileira. Trata-se apenas de mais uma das contas que pagamos pelo descaso com a produtividade em nome da “nova matriz macroeconômica”, cuja obsessão com a expansão do consumo e com o microgerenciamento da economia minou as bases do crescimento sustentado.

A lugar algum
(Publicado 08/Out/2014)

9 comentários:

Ola Alexandre

Ha evidencia de que o salario dos jovens de 18 a 24 anos que trabalham tenha aumentado?

O maior paradoxo "heterodoxo" e economistas como Krugman,o ganhador atual do Nobel de economia ganharem prêmios escrevendo teses Keynesianas,defendendo teses de falha de mercado.

"Ha evidencia de que o salario dos jovens de 18 a 24 anos que trabalham tenha aumentado?"

Não vi dados a este respeito; se há evidência, desconheço.

Aparentemente ninguém lá sabe corrigir valores nominais pela inflação...

Houve um aumento de vagas em universidades e um grande aumento de instituições do ensino técnico federal. Isso poderia ter algum impacto: mais jovens optando pelo ensino e postergando sua entrada no mercado de trabalho?

Prezado Alex,

Estes estudos captam a migração do mercado de trabalho da carteira assinada para PJ?

Com a recente mudança legal, estão se criando milhares de MEIs em todo o BR.

Alex: alguém já pensou em analisar a correlação com o aumento da taxa de encarceramento e/ou uso de drogas pesadas (crack), que é preponderante na faixa mais jovem da população?

Alex,

Se os jovens estão se retirando principalmente para estudar (vide Pronatec com 4 milhões de inscritos, FIES com mais de 300 mil matriculados, etc) , então o impacto contracionista sobre a capacidade produtiva é algo de curto prazo.

No longo prazo, o acúmulo de capital humano pode mais do que compensar a queda da participação (ou pelo menos aliviar o impacto da queda da participação).

Aliás, se o maior engajamento com estudos for algo permanente, então é possível que haja um efeito permanente na redução da taxa de participação (o que poderia ser testado via quebra estrutural nessa variável tradicionalmente estacionária).

O que acha?

Economista X